A Representação Passiva: por quê calar a participação?

[Alessandra Maia]

 Não foi surpresa saber que veio das cidades a reclamação sobre o repúdio da Câmara Federal à nova Proposta de Participação Social. – “Câmara na contramão das ruas” (Frente Nacional dos Prefeitos –  http://www.fnp.org.br/noticias.jsf)

Tachada de anti-democrática, a tentativa – ainda que por decreto – de estreitar os laços entre Estado e sociedade, com a previsão de maior participação da última foi barrada pelos deputados recentemente.

É curiosa a plasticidade desse modo de representar ainda presente em muitos dos nossos deputados, que relembra a tradição de algumas imaginações ideais do Brasil. Tradição de representantes isolados e atônitos perante uma sociedade descrita – entre massa amorfa ou massa de manobra – e o passado se faz presente no diagnóstico de que a população não pode decidir, ou mesmo ser consultada ou receber informações sobre como são feitos os aportes de vultosos recursos no país para a saúde, a educação, o transporte ou a moradia, por exemplo.

O fato político recente foi que a possibilidade real de discussão sobre a ampliação da prática que envolve escuta, consulta e acompanhamento na elaboração de políticas públicas no país foi, digamos assim, deitada ao chão rapidamente no calor dos ânimos facciosos pós-pleito eleitoral.

Se os deputados houvessem buscado informações saberiam, por exemplo, de acordo com a última MUNIC do IBGE de 2011, que dos 5.565 municípios brasileiros, a sua quase totalidade – 5.553 municípios contam com Conselhos de Saúde em funcionamento nas suas cidades. E não se sabe dessas instâncias obstarem a atuação dos vereadores, por exemplo.

Também estariam a par de que os temas que mais geram cooperação entre os municípios (pois é, a sociedade amorfa coopera), os consórcios intermunicipais, além de prever participação e cooperação técnica de entes federados em projetos e na execução de políticas públicas, diz respeito exatamente às áreas da habitação, da saúde e da educação, aonde atuam os conselhos de políticas públicas nas cidades pelo país.

É óbvio que seria desejável, do ponto de vista de análise, que a proposta de ampliação da participação fosse oriunda de iniciativa popular. Fôssemos levar a teoria ao pé da letra, nem a constituinte em 1988 teria sido exequível, afinal, não foi uma Constituinte Exclusiva do ponto de vista dos critérios representativos que diziam respeito à eleição dos constituintes. É sabido que a muito custo a experiência democrática brasileira e suas disputas históricas constituiu à época um Congresso Constituinte, e foram inegáveis os avanços da Constituição Cidadã.

Elaborar sobre o tema da participação, regulamentar a complementaridade da participação na direção das políticas públicas está previsto no texto constitucional. Foi exatamente essa atribuição legal que permitiu a instituição dos conselhos hoje existentes, ao longo da década de 1990. Conselhos, audiências públicas, são mecanismos, diga-se de passagem, que contém participação de profissionais das diversas áreas de atuação, membros do executivo e representantes da sociedade civil, paritariamente.

Sua progressão no tempo tem sido lenta e gradual, afinal, a democracia prevê opiniões contrárias, discussão e muito tempo gasto nesse processo. A democracia, em seu sentido clássico, significava a possibilidade de diálogo, a mediação da palavra enquanto suspensão da violência, e uma prática enquanto forma de resolução dos conflitos de interesses.

A participação será consultiva, não terá poder de decisão: mais uma vez o espanto. Nossos representantes parecem estar passivamente elaborando suas ideias sobre o futuro, garantindo sua posição na manutenção do status quo: da desigualdade de renda, do interesse do latifúndio, da precariedade das cidades. A participação da sociedade seria exatamente esse elemento a mais, o que pode legitimar ou ao menos arejar as ideias de uma representação mais de acordo com as expectativas sociais nela ensejadas pelas últimas eleições.

Caso contrário já se sabe o resultado. Nossa representação seguirá passiva (ou mesmo refém?)  das suas próprias imaginações sobre a sociedade, sem chances de escutar ao menos, o que a sociedade poderia ter a lhe contar sobre si.

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