O Broxa: O dia em que Francis teve sua virilidade posta à prova (PARTE II)

[Fernando Navarro]

 [NE.] A Revista Pittacos está publicando os quatro episódios do conto inédito O Broxa, de Fernando Navarro. No primeiro e surpreendente episódio (http://revistapittacos.org/2013/02/18/obroxa/), Francis discute com Bob, numa mesa de bar. Bob defende que todo mundo, no fundo, é homossexual, dependendo apenas uma questão de momento. Já Francis se recusa a aceitar e se proclama macho irremediável. No calor da discussão e impulsionados pelo entusiasmo etílico, Bob desafia Francis. Vai acariciar seu pau durante um minuto, se ele não crescer a hipótese da macheza de Francis estará salva. Caso contrario será Bob quem tem razão. Apavorado, Francis tenta escapar da situação, mas a pressão do Bob e, em seguida dos presentes no bar não deixam alternativa. Começa o desafio.

(…)

Logo todos o acompanhavam, em coro.

_ Dez, nove, oito, sete…

No meio do tumulto, Martins pegou no braço de Francis e tentou um último apoio:

_ Coragem.

_ Quatro, três, dois, um, VAAAIIII!!!…

Silêncio geral. Uma pequena multidão se aglomerava em torno da mesa. Sentados frente a frente, os dois contendores. Bob veio na direção de Francis, mas não pôs logo a mão. Primeiro olhou bem nos olhos dele, o que o deixou ainda mais nervoso, e falou pausado:

_ Não tenha pressa, ele não cresce logo no início, só acontece nos últimos quinze segundos. Já fiz isso outras vezes.

Francis olhou para o Martins com olhos de súplica. Não havia o que fazer. Martins apenas ensaiou uma expressão de quem diz “vai em frente”.

Bob continuou com o suspense. Permaneceu imóvel, olhando nos olhos de Francis mas sem tocá-lo.  Em seguida começou a aproximar a mão do pau e Francis. Primeiro fez uma leve carícia por cima, depois pegou o conjunto todo. Francis teve um sobressalto quando sentiu a mão abarcar sua genitália. Mas controlou-se. Não poderia deixar escapar qualquer som suspeito, mesmo que fosse de susto. Um suspiro ou um gemido naquela situação seria um erro grave. Numa hora dessas, pensou, um simples gemido pode comprometer a reputação de três ou quatro gerações. Conteve-se, pois.

Mas a mão de Bob estava em plena atividade. E o pior, era uma mão muito delicada, sabia pegar o bicho com jeito. Francis teve medo de que, por algum motivo obscuro, seu pau resolvesse crescer. Sim, afinal, era pau, estava acostumado a crescer sempre que lhe faziam aquilo, vai saber o que se passa na cabeça de um pau. Resolveu que tentaria contornar a ignorância fálica com subterfúgios tais como pensar em algo que não fosse excitante de maneira nenhuma. Alguma coisa terrível, algo que sob hipótese alguma pudesse sugerir fantasias eróticas. Mas o que? Logo ele que qualquer pensamento naturalmente desandava em pornografias e perversões. Quem sabe pensar na sua própria situação, caso o pau ficasse duro? Isso sim seria uma coisa terrível. Mas não, era melhor não, pois a imagem do pau duro poderia ter um efeito nefasto. Procurou então fixar a lembrança na sua querida Hertha, vira-lata de rua, um doce de cachorra. Sofreu muito para morrer. Um episódio realmente triste em sua vida. Isso, um episódio triste, era justamente o que ele precisava. Importantíssimo o apoio de Maria Valéria, que conheceu na ocasião, lá mesmo no veterinário. Sua cachorra atropelada em cima de uma mesa de hospital e, de repente, uma alma foi solidária. O problema eram os peitos de Maria Valéria, dois belos peitos! Pronto, estava arruinada a lembrança. Precisava urgentemente esquecer Hertha e Maria Valéria antes que isso interferisse na aposta. A mão de Bob estava ali, na função, e aquele relógio demorando horrores para andar. Sensações apavorantes, uma pressão tremenda sobre ele e tudo isso correspondera a meros 5 segundos. O negócio ia ser duro, pensou. Pensou mas se arrependeu com o trocadilho infame. Se qualquer coisa ali ficasse dura era o fim, seria a ruína de uma imagem pessoal construída laboriosamente ao longo de quase 30 anos. Era preciso começar a mentalizar algo que não o levasse a pensar em mulher de modo algum.

Pensou no Papa, isso, o Papa. Por princípio o Papa fica longe de mulher. Mas também não gosta de veado. Proíbe o cidadão de ser veado. Eis aí um sujeito para não gostar de veado, pensou. Falou que é veado, não senta nem pra conversar. Padre veado, então, não aceita nem debaixo de pau. Mas também não quer saber de padre mulher, não confia em mulher, só confia em homem, pois para ser padre tem que ser homem, mulher não leva jeito, não sabe, não pode. Que coisa!,  refletia, mas então o Papa só gosta de homem?

Chegou nesse ponto e especulou: engraçada essa fissura por algo religioso num momento assim tão pouco cristão. Quem sabe tinha a ver com a sua formação? As freiras com aquela repressão toda. Chegou a ser advertido pela madre superiora porque havia se apaixonado por uma colega de classe, com apenas 6 anos de idade. Não encostou um dedo na menina, apenas se apaixonou, e ainda assim foi advertido daquela maneira. Poderia ter virado um maníaco sexual. Era isso. Sua obsessão por sexo vinha das freiras. Eram terríveis, completamente pervertidas. Inculcavam as mais endiabradas aberrações na cabeça das crianças. Pensou bem e concluiu que quando uma freira pega um recém-nascido no colo, ele imediatamente começa a pensar em sacanagem. Então nada de freiras, pois freira acaba em sexo. Era preciso tirar as freiras da cabeça o mais rápido possível. Mas pensar em que? Esquecer as freiras e substituí-las, mas porquê?

Foi então para marshmallow. Aquela coisa branca que os primos trouxeram de Nova York dizendo que era uma maravilha, frenesi dos americanos, mas era uma porcaria. Um tufinho branco que derretiam no fogo e virava uma gosma doce. Construíram um império para isso? De repente a mão de Bob improvisou uma variação que não fosse o Francis homem, macho de verdade, teria se arrepiado. Virgem Santa, pensou assustado, era só o que me faltava! Precisava mais que nunca levar a mente para um tema que fosse realmente árido. Pensou então na luta de classes, boa ideia, a luta de classes como motor da história. Nada mais árido do que isso. Apegado à luta de classes dificilmente se veria vítima de algum estímulo erótico que pusesse tudo a perder. O motor da história. Existe história desde que existe a luta de classes. E quando seria isso? A partir de quando se pode dizer que começou a luta de classes? Nas antigas sociedades tribais? Ou apenas naquelas já com um estado constituído? Sumérios? Egito? Grécia? Sim, a Grécia. Cidadãos e escravos. Ali já víamos a luta de classes bem desenhada. Mas para os gregos a história começa mesmo com a Guerra de Tróia. Tróia foi o início de tudo, foi o mote que inspirou Homero a compor dois dos fundamentos da cultura ocidental: a Ilíada e a Odisséia. Na verdade tudo começa com um adultério. Menelau, rei de Esparta era casado com um mulheraço chamado Helena. Imaginava uma baita loira de 1,75 m ou 1,80 m (sempre gostou de mulheres grandes). Mas não! Que erro! Nem grandes, nem pequenas, não podia pensar em mulher agora. O problema é que aquele episódio sempre o fascinara. Helena se mandou com Páris, fugiram para Tróia. Menelau ficou uma arara. Queria esmagar, matar, destruir, e conclamou os reis gregos a irem para o pau com os troianos. A turma do deixa-disso tentou acalmá-lo, mas não houve jeito. Todo mundo foi forçado a ir e deu no que deu. A guerra, os intermináveis episódios de batalhas, heroísmos, vitórias, derrotas, massacres e fantasias, até que alguém resolveu botar aquilo tudo num livro e escreveu a Odisséia e a Ilíada. Nascia assim a civilização ocidental, herdeira de um chifre. Então era isso! O chifre é que era o verdadeiro motor da história e não a luta de classes. Não fosse o furor uterino da rainha de Esparta e não estaríamos aqui.

Francis ia muito bem nesse devaneio quando percebeu que suava. E Bob, usando as duas mãos com extrema habilidade (Francis já reconhecia), variava de pau para saco e de saco para pau, tocando de leve nas coxas. Aquilo era o fim. Arrependia-se de ter aceitado uma coisa daquelas. Foi quando, de repente, sentiu que Bob era excessivamente ousado.  Deu um pulo e protestou:

_ Epa! O que é isso? Aí não!!!

_ Calma, calma.

_ Calma nada. Você passou a mão no meu… na minha bunda!

_ E qual é o problema, ficou com medo?

_ Não senhor.  A gente combinou que era mão no pau. Isso de bunda está fora!

O público abandonou de vez a compostura:

_ DEIXA! DEIXA! DEIXA!…

Mas Francis não queria topar.

_ Não deixo não, nunca! Fala alguma coisa, Martins.

O amigo tomou suas dores. Também levantou a voz e decretou:

_ É isso aí. Pau, pau. Cu, cu. Não pode misturar as coisas. Se for rolar cu, acaba o jogo agora mesmo!

Apesar da apatia, Martins estava nervoso pelo amigo. Não gostava de vê-lo naquela situação e também se preocupava com a hipótese de algum acidente de percurso que fizesse o maldito pau crescer. Era uma perspectiva medonha.

Bob recuou e recolocou placidamente a mão de volta no pau de Francis.

_ Ok, ok, não tem importância. Era só pra colocar um pouco mais de tempero na nossa relação… Se você prefere que eu pegue no seu pau, pra mim está ótimo.

Francis se sentou. Bob recomeçou.

(cont…)

*Não perca a continuação dessa história. http://revistapittacos.org/2013/03/04/broxaiii/

**Leia aqui a primeira parte: http://revistapittacos.org/2013/02/18/obroxa/

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